“Mães de Verdade”, de Naomi Kawase

Há seis anos, visitei o Japão. Este país, sabemos, fica do outro lado do mundo. Para mim, porém, ficava mais longe. Quando venci as 29 horas de voo que me separavam daquele território, eu sabia que era mais que um corpo nascido no Brasil que trasladava: em mim, moviam-se circunstâncias pessoais, familiares, históricas. Agitavam-se, sobretudo, as palavras não ditas, o silêncio de uma gente que sabe se guardar.

Ao pisar no Aeroporto de Narita, chorei como uma criança. Entre soluços, pensei: "Como eu estava com saudade deste lugar em que eu nunca estive". Depois, ainda inteirei: "A vida de um homem é saber de onde veio o seu pai".

Os segredos que vão nos constituindo prepararam, ali, uma surpresa. Do Brasil, a minha companheira, Daniele Sampaio Sampaio, me liga e festejamos: viajei para conhecer a terra do pai, mas, de lá, voltaria pai eu mesmo!

Isto tudo me arrebatou como lembrança porque assisti ao lindíssimo "Mães de Verdade", filme da diretora japonesa Naomi Kawase. Na história, um menino é adotado por um casal que não pode ter filhos biológicos. Passados seis anos - ai, ai, a idade exata do meu próprio filho hoje! - ele, claro, segue nascendo. A sua história - como todas! - estimula que cada um e cada uma também vá parindo a si.

A obra apresenta um mote de canção infantil: "Te encontrei". Como num enigma meditativo, de repente, não sabemos se falamos isso a quem conosco cruza caminhos ou a este outro de nós mesmos que, mudo, vai nos empurrando em direção a "não-sabemos". Somos todos, afinal, um pouco como este conjunto de ilhas que forma o arquipélago japonês: uma porção de mistério cercada de solidão por todos os lados. A vida de um homem é, também, desconhecer para onde vai o seu filho.

"Mães de Verdade" está na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo que, neste ano, tem uma imperdível versão digital.

ponto de vistaEduardo Okamoto